No mês em que completa seu 11° aniversário, a chamada Lei de Cotas no Brasil apresenta resultados importantes. O aumento no número de beneficiários, a inclusão de novos grupos minoritários e a implantação de um sistema unificado de ingresso nas universidades são alguns dos fatores a comemorar, mas grupos que representam as minorias cobram uma revisão do texto e uma ampliação do debate.
Segundo o Consórcio de Acompanhamento das Ações Afirmativas (CAA), em 2011, antes da entrada em vigor das cotas em todo o país, negros e indígenas representavam apenas 31% das matrículas nas instituições federais. Pessoas das classes C, D e E, eram 19%. Em 2020, o primeiro grupo saltou para 52% e se tornou majoritário. O segundo manteve a mesma proporção.
A Lei de Cotas reserva 50% das vagas em universidades e institutos federais para egressos de escolas públicas e embute nessa parcela outros filtros para elegíveis, como renda familiar per capita abaixo de 1,5 salário-mínimo, pretos, pardos, indígenas e pessoas com deficiência. O texto base da Lei de Cotas espera revisão prevista pelo Congresso Federal desde o ano passado. No entanto, não há previsão para isso acontecer. Os parlamentares paralisaram a análise em meio ao período eleitoral.
Para os defensores da manutenção das cotas, não há dúvidas sobre o bom resultado da lei em relação ao seu principal objetivo: aumentar a presença negra e de outros grupos sub-representados nas melhores universidades do país e consolidar esse instrumento de mobilidade social, ampliando o acesso de pretos e pardos a melhores empregos.
“Tais políticas são a materialização de um compromisso com a construção de conhecimentos capazes de contribuir mais e melhor para a sociedade, subsidiando o delineamento de ações efetivas para a garantia da equidade e da diversidade em nossas instituições e a observância dos objetivos do desenvolvimento social mais igualitário”, defende Luana Morais, acadêmica de Direito e coordenadora da Subcomissão de Acadêmicos e Estagiários da OAB/GO.
A Subcomissão coordenada por Luana está em contato com as universidades de Direito no estado auxiliando os futuros advogados a terem uma melhor transição da faculdade para o mercado de trabalho. Ela também defende pautas relacionadas aos interesses dos estudantes. Entre esses temas está a maior diversidade no universo acadêmico.
A Universidade Federal de Goiás (UFG), por exemplo, com seus mais de 21 mil estudantes, tem em seus câmpus retratos de diversidade. Segundo o Analisa UFG – plataforma de análise da UFG que disponibiliza dados públicos da Universidade – 55% dos estudantes vêm de escolas públicas com uma renda média de 1,29 salários-mínimos.
No Brasil, 18% dos jovens negros de 18 a 24 anos estão cursando uma universidade, segundo o estudo sobre ação afirmativa e população negra na educação superior, publicado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). “Precisamos aumentar essa parcela de pessoas negras ocupando os cursos superiores. Entre os jovens brancos, o número sobe para 36%”, aponta Luana, usando também dados do Ipea.
O advogado Eder Porfiro Muniz, presidente da Comissão de Direito Criminal (CDCRIM) da OAB/GO, afirma que a cota sempre foi e será necessária. “Ela veio para igualar o acesso ao ensino superior, visando reparar uma dívida histórica de inclusão do negro nas faculdades onde, por muito tempo, devido ao racismo e a segregação social, não foi permitido tal acesso”, resume.
Mercado de trabalho
Entretanto, esse aumento da diversidade ainda não é refletido no mercado de trabalho. Um levantamento feito pelo Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (Ceert), de 2019, apontou, por exemplo, que os negros representavam 1% dos advogados de grandes escritórios. Na ocasião, a instituição avaliou, em parceria com a Aliança Jurídica pela Equidade Racial, nove bancas de São Paulo.
Esse dado, se comparado com a porcentagem de negros na sociedade (aproximadamente 55%, de acordo com o IBGE), evidencia um problema: ou os escritórios contratam menos negros ou as disparidades sociais, que afetam a população negra com maior intensidade, acabam fazendo com que grande parte deles fique no meio do caminho.
Eder Porfiro acredita que o número de advogados no mercado de trabalho está aumentando, mas proporcionalmente, ainda é muito pequeno. “Precisamos avançar nessa pauta. Os escritórios, além de avaliar a competência, devem sim olhar para essa questão. Todos advogados negros que eu conheço são muito competentes”, garante.
Ele foi um dos primeiros advogados negros a presidir a CDCRIM. “Como advogado negro, sinto que cheguei a uma posição que poucos alcançaram, mas quero alcançar ainda outros lugares. Mas estou insatisfeito. Quero que vários dos meus colegas alcancem lugares de destaque”, defende.
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