Marcelo* foi abordado na rua por policiais em um carro descaracterizado no dia 6 de agosto de 2020, no Rio de Janeiro.
“Não era o carro da [Polícia] Civil, era um carro branco… Me abordaram na rua, com arma na minha cara, perguntando meu nome e já me algemando.”
Completamente desnorteado, ele chegou a questionar os policiais sobre o que estava acontecendo, do que estava sendo acusado, mas ouviu dos agentes que alguém lhe explicaria na delegacia.
No trajeto entre o bairro em que mora em Niterói (RJ) e a 76ª DP, ele tentava manter a calma. “Eu pensava: foi um erro, eles vão ver que é um erro. Vai vir a advogada e eu vou sair. Mas não foi isso o que aconteceu.”
O jovem de 24 anos passaria 55 dias preso por um crime que não cometeu.
Marcelo só foi informado de que estava sendo acusado de roubo dias depois da prisão, quando já havia sido transferido da carceragem da 76ª DP para o presídio José Frederico Marques, em Benfica, na Zona Norte do Rio
Lá, sua advogada lhe disse que a vítima de um assalto a mão armada ocorrido em julho o teria reconhecido em uma fotografia no álbum de suspeitos da delegacia. Foi um choque.
Ele não tinha passagem pela polícia e não fazia ideia de como uma imagem sua tinha parar em um catálogo de suspeitos.
A foto, Marcelo descobriria, fora retirada de sua conta no Facebook. Datava de 2017, uma época em que usava cabelo curto, “raspado na [máquina] zero ou na um” — um estilo bem diferente do que exibia em 2020, com cabelos compridos e com tranças.
Como uma imagem de rede social de um jovem sem nenhuma passagem pela polícia foi parar em um álbum de suspeitos?
A polícia não lhe respondeu. Nem à OAB (Organização dos Advogados do Brasil): a Comissão de Direitos Humanos e Assistência Judiciária da OAB-RJ enviou um ofício à 76ª DP — e a outras quatro delegacias onde houve casos semelhantes — e recebeu de volta respostas genéricas, diz a advogada Sônia Ferreira Soares, membro da comissão.
O argumento foi que, por questões de confidencialidade, a delegacia não poderia detalhar o método de elaboração dos álbuns.
À BBC News Brasil, a Secretaria de Polícia Civil do Rio de Janeiro afirmou que as fotos do jovem foram extraídas das suas próprias redes sociais, “consideradas fontes abertas, procedimento comum utilizado pela Polícia Civil para realizar levantamento de identificação e qualificação de autores de crimes”.
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