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Em 10 anos mais de 1.500 pessoas foram resgatadas da escravidão em Goiás

Nathan Sampaio e Raphael Bezerra

Dados da Subsecretaria de Inspeção do Trabalho (SIT), órgão do Ministério da Economia, obtidos pela agência de dados independentes ‘Fiquem Sabendo’, por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI), mostram que na última década mais de 19 mil pessoas foram resgatadas em situação de trabalho escravo no Brasil. Neste período, segundo mostra a pesquisa, 1.387 operações foram realizadas no País, das quais, 100 foram em empresas suspeitas localizadas em 46 municípios de Goiás – a maioria na região Sudoeste e Oeste – que resultaram no resgate de 1.564 vítimas.

Na região Sudoeste foram apenas quatro cidades, porém, envolvendo 22 ações contra empresas suspeitas de submeter pessoas a trabalho análogo à escravidão – 13 destas apenas em Gouvelândia – seguida da região Oeste com 17 ações em sete municípios, dentre eles Aragarças, onde houve apenas uma autuação em 2010, mas com o maior número de resgate, até então, envolvendo 144 pessoas que trabalhavam em uma fazenda de cana-de-açúcar. Na Região Metropolitana, onde fica Goiânia, foram 14 ações em cinco municípios, um deles a Capital.

Já na região Norte houve 12 ações em sete municípios, na região Sudeste, 10 autuações em sete cidades, na região Sul, nove ações em quatro municípios, as regiões Nordeste e Noroeste com quatro ações em três municípios cada. O Entorno do Distrito Federal contabilizou três autuações em três municípios e, por fim, a região do Centro goiano, onde fica Anápolis, registrou duas ações em dois municípios.

Outro dado importante mostra que de 2010 a 2021 houve uma variação de operações do tipo em Goiás. Em 2010 foram registradas 13 operações, em 2011 foi o ano com mais autuações, há registro de 24 e seguindo respectivamente 2012 com 12, 2013 com 8, 2014 com 10, 2015 com uma, 2016 com duas, 2017 com cinco, 2018 com seis, 2019 sem operações registradas, 2020 com duas e 2021, até então, com duas ações. A reportagem entrou em contato com o Ministério Público do Trabalho (MPT) para confirmar as ações, porém não teve retorno até a publicação desta matéria.

No Brasil, o estado de Minas Gerais foi o que mais registrou resgates na década (28,88%), seguido por Pará (10,97%) e São Paulo (8,39%). As atividades mais comuns foram criação de bovinos para corte (15,96%), construção de edifícios (11,58%) e cultivo de café (7,59%). Em números absolutos, 6.696 pessoas foram resgatadas nesses setores nos últimos 10 anos.

Ao menos 18 empresas aparecem na lista com mais de 100 trabalhadores resgatados de suas instalações no período, duas em Goiás. Na maior parte das áreas houve redução no número de resgatados em 2020, ano de início da pandemia, mas houve aumento no cultivo de café (de 106 para 140) e de soja (de sete para 30).

Vale lembrar que as informações foram obtidas antes de o Ministério da Economia mudar o entendimento sobre a publicidade dos dados, já que o governo Bolsonaro parou de disponibilizá-los neste ano, por entender que os dados violariam a Lei-Geral de Proteção de Dados.

Reforma trabalhista

Além disso, a reforma trabalhista discutida em 2017 já “banalizou” o trabalho escravo, dificultando seu combate, de acordo com especialistas que atuam na erradicação do crime no País. A reforma não alterou a forma como o trabalho escravo é caracterizado pela legislação, mas trouxe várias mudanças na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) que afetam o combate ao crime. Não suficiente, em agosto deste ano centrais sindicais divulgaram uma nota criticando os “jabutis” da MP 1.045, cujo texto-base foi aprovado na época, na Câmara dos Deputados.

O texto mudou uma série de regras para os trabalhadores, por exemplo, criando modalidades de emprego sem carteira assinada e sem direitos trabalhistas e previdenciários. São apelidadas de “jabutis” as emendas que acrescentam matérias estranhas ao conteúdo original de uma proposta. O relator ampliou as mudanças sem alarde, com a sessão em andamento, pouco antes de o relatório ser votado.

Para as centrais, o governo tentou ressuscitar, na MP, pontos da Carteira Verde Amarela, uma medida provisória que o governo revogou porque não seria votada a tempo e perderia a validade. Elas defendiam que mudanças na legislação trabalhista fossem “objeto de projeto de lei específico, devidamente analisado e debatido nas instâncias do Congresso Nacional, com ampla participação das representações dos trabalhadores, dos empregadores e do governo”.

A nota é assinada pelos presidentes de onze centrais: CUT, Força Sindical, UGT (União Geral dos Trabalhadores), CTB (Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil), CSB (Central dos Sindicatos Brasileiros), dentre outras. Felizmente, a medida provisória foi rejeitada, não podendo mais as empresas firmarem novos acordos de suspensão de contrato de trabalho ou redução de salário com redução de jornada.

Maior resgate no País em 2021 foi em Goiás

Um resgate de 116 trabalhadores escravizados na colheita de palha para os cigarros da empresa Souza Paiol — maior fabricante de cigarros de palha do Brasil, foi realizado em Água Fria de Goiás (GO), a 140 quilômetros de Brasília. A operação, divulgada pelo portal Repórter Brasil, começou em 13 de outubro e foi encerrada na quarta-feira (20) da última semana.

De acordo com as informações divulgadas, considerando o número de envolvidos, foi o maior resgate de trabalhadores em condições análogas à escravidão realizado este ano. Entre os trabalhadores estavam cinco adolescentes, sendo um de apenas 13 anos, o que é proibido pela Constituição, especialmente em atividades exaustivas como a separação de palha

Integrantes do grupo relataram que trabalhavam com fome, pois a jornada começava às 5h e eles não tinham direito a café da manhã. O primeiro alimento chegava por volta das 11h e consideravam a refeição precária. Devido a essa situação, os trabalhadores temiam sofrer um mal súbito, segundo contaram aos auditores. De acordo com o auditor-fiscal do trabalho, Marcelo Campos, eles recebiam apenas mais uma marmita no dia. “Se ficassem doentes e não trabalhassem, era descontado R$ 15 pela marmita”, teria afirmado uma das vítimas, que também não tinham equipamentos de segurança e viviam em um alojamento sem condições mínimas de higiene.

“Não tinham nenhum direito trabalhista, dormiam em alojamentos péssimos, não recebiam equipamentos de proteção individual e o motorista do ônibus que os levava para a colheita não era habilitado”, detalha o auditor-fiscal do trabalho, que coordenou a operação feita pelo Grupo Especial de Fiscalização Móvel (GEFM).

Ainda de acordo com as informações divulgadas, as indenizações pagas aos trabalhadores somam cerca de R$ 900 mil e foram pagas pelo empresário José Haroldo de Vasconcelos, responsabilizado por manter os trabalhadores escravizados e a Souza Paiol. O Ministério Público do Trabalho (MPT) e a Defensoria Pública da União (DPU) vão propor um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com a Souza Paiol. Antes de ser flagrado com trabalho escravo, Vasconcelos também foi alvo de uma operação do Ministério Público de Minas Gerais e da Receita Estadual, que o acusou de sonegação fiscal e de não ter pago cerca de R$ 20 milhões em tributos.

O HOJE

Sobre o Autor

Rosenwal Ferreira

Rosenwal Ferreira é jornalista, publicitário e terapeuta transpessoal. Multimídia talentoso, ele atua na TV Record realizando comentários no quadro 'Olho no Olho', no Balanço Geral. Mantém, há mais de 18 anos, o programa 'Opinião em Debate' que agora está na PUC TV. No meio impresso, é articulista no Diário da Manhã, e no Jornal OHoje.
Radialista de carteirinha, comanda o tradicional programa jornalístico 'Opinião em Debate', que já ocupou o horário nobre em diversas emissoras, e hoje, está na nacionalmente conhecida Rede Bandeirantes 820AM, de segunda a sexta-feira, das 07h30 às 08h30 da manhã. Logo após é membro da bancada mais ativista da felicidade, das 8h30 até às 10h da manhã, na Jovem Pan Goiânia 106,7FM.

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