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Orgulho que vem da luta

No dicionário Michaelis, uma das definições da palavra “orgulho” é “sentimento de respeito que alguém sente por si mesmo”. Trata-se, portanto, do oposto da vergonha, sentimento descrito como de “humilhação ou desonra”, “receio de se sentir ridículo”.

Com essas concepções em mente, fica fácil entender o por que de a comunidade de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros (LGBT) bradar o sentimento de autoaceitação, e inclusive ter um mês inteiro dedicado a isso. Afinal de contas, integrantes desse grupo por muito tempo foram condenados à rejeição pela sociedade e, em muitos casos, por aqueles que mais deveriam acolhê-los.

Um grande passo para a mudança desse paradigma e para que a comunidade começasse a fazer sua voz ser ouvida foi a revolta de Stonewall Inn, ocorrida há exatos 48 anos, na cidade de Nova York, nos Estados Unidos. O centro do acontecimento, um bar de higiene precária e qualidade duvidosa, era um dos poucos locais que serviam de ponto de encontro de gays e travestis em uma época em que não seguir os preceitos heteronormativos era crime. Por isso mesmo, o estabelecimento era alvo frequente de batidas das forças policiais, que não se eximiam de humilhar e agredir os frequentadores.

A situação mudou naquele fatídico 28 de junho de 1969, quando cansados daquela perseguição, os frequentadores se “amotinaram” e contra-atacaram, num evento que durou seis dias. O episódio inspirou milhares de pessoas em todo o mundo e ficou conhecido como o maior marco na luta pelo direito dos LGBTs.

“Uma pergunta que os policiais e a própria sociedade faziam naquela época era ‘você não tem vergonha de ser gay?’, ou ‘você não tem vergonha de ser lésbica?, de ser travesti?’”, explica o presidente do Grupo Eles por Eles, Liorcino Mendes. “Então naquele dia a comunidade LGBT revidou e passou a dizer que não, não tinha vergonha. Tinha orgulho de ser quem era.”

Representatividade

Liorcino relata que a comunidade LGBT por muito tempo esteve por conta própria na luta pelo respeito e asseguração de direitos. No entanto, ao longo do tempo a mídia foi se tornando uma aliada nessa batalha. Mas nem sempre foi assim.

“Nós tivemos etapas. Na década de 1980 era tabu. Não se falava de homossexualidade nos meios de comunicação. Depois, passou-se a falar associando à Aids, e foi assim até a década de 1990. Só neste século, com a internet, as paradas do orgulho LGBT, as novelas brasileiras, que começaram a apontar para um novo caminho, uma representatividade além da questão da Aids”, analisa o ativista. Ele acrescenta que, ao longo dos anos, a população LGBT deixou de estampar as editorias de polícia nos jornais, seja como vítimas de violência ou eventuais perpetradores de crimes, para estar presente em todas as editorias. “Hoje estamos na política, nos cadernos de cidades, de esportes, de cultura. Isso é muito importante”, diz.

Esse papel que os jornais e programas televisivos desempenham no combate ao preconceito é fundamental, avalia Liorcino, mas não é o bastante. “A mídia tem contribuído muito, buscando esclarecer o que é a homossexualidade, o que é a transexualidade. Mas não temos por parte das escolas um programa voltado para alunos e professores nesse sentido”, destaca. “Acaba que na mídia a população vê uma coisa, mas na escola há uma omissão total.”

Ele acredita que as escolas brasileiras precisam de um projeto direcionado ao combate ao preconceito, aos moldes daquele que seria implementado com os Kits Anti-Homofobia – que acabou apelidado maliciosamente como Kit Gay por detratores. “Temos que ter a educação brasileira trabalhando na construção de uma sociedade que rompa o preconceito e a discriminação, seguindo o exemplo que a mídia vem fazendo”, declara.

Ele reconhece grandes avanços que a comunidade LGBT obteve nos últimos anos, especialmente no âmbito jurídico. “Tivemos o reconhecimento do casamento entre pessoas do mesmo gênero, o direito à pensão assegurado, o uso do nome social de travestis e transexuais”, enumera. O mesmo, porém, não se vê no Legislativo. “Há um conservadorismo exacerbado por parte das bancadas fundamentalistas religiosas que não deixam passar nenhum projeto de lei que beneficie a comunidade LGBT”, diz.

Entraves legais à parte, Liorcino acredita que o principal desafio enfrentado pelas pessoas que não se enquadram no padrão heteronormativo é a violência. De fato, dados do Grupo Gay da Bahia (GGB) indicam que do início de 2017 até o início de maio, 117 LGBTs foram assassinados no País em razão de sua orientação sexual ou identidade de gênero. Trata-se de uma morte a cada 25 horas.

“O Brasil é o País onde mais se mata LGBT no mundo e não há nenhuma política de enfrentamento a essa violência”, critica Liorcino. “Falta segurança para a comunidade, principalmente para travestis e transexuais que são muito perseguidos, têm seus direitos humanos violados diariamente e são assassinados por motivos inconcebíveis em pleno século 21”, destaca.

Celebração do orgulho

Isabel Cristine presidente Associação da Parada do Orgulho LGBT de Goiânia (APOLGBT-GYN), também vê grandes dificuldades para a comunidade de transexuais e travestis. “Acredito que as pessoas que fazem a opção do seu sexo devem ter direio à sua identidade, a certificação documental. Deve-se falar sobre isso”, pondera.

Como presidente da APOLGBT, Isabel luta por essa e outras questões. É ela quem está coordenando os preparativos para a parada LGBT deste ano.

A ativista se orgulha de dizer que em 2017 é a primeira vez que a Parada do Orgulho LGBT de Goiás tem à frente uma mulher. Não à toa, o tema escolhido para o evento em 2017 é “Lesbofobia é Crime”. “Pela primeira vez o ‘L’ da sigla vai ter visibilidade”, acentua.

A programação do evento, previsto para o dia 10 de setembro, será lançada no auditório Solón Amaral, da Assembleia Legislativa (Alego), às 18h30 desta quarta-feira (28) – exatamente no aniversário da revolta de Stonewall. “Vai ser a primeira vez que haverá um lançamento oficial da parada”, destaca Isabel.

A expectativa é que mais de 200 mil pessoas compareçam ao evento de setembro. Nos dias que antecedem a passeata, a associação organiza uma série de encontros com representantes das áreas da saúde, da educação e da Alego para apresentar suas pautas.

Sobre o Autor

Rosenwal Ferreira

Rosenwal Ferreira é jornalista, publicitário e terapeuta transpessoal. Multimídia talentoso, ele atua na TV Record realizando comentários no quadro 'Olho no Olho', no Balanço Geral. Mantém, há mais de 18 anos, o programa 'Opinião em Debate' que agora está na PUC TV. No meio impresso, é articulista no Diário da Manhã, e no Jornal OHoje.
Radialista de carteirinha, comanda o tradicional programa jornalístico 'Opinião em Debate', que já ocupou o horário nobre em diversas emissoras, e hoje, está na nacionalmente conhecida Rede Bandeirantes 820AM, de segunda a sexta-feira, das 07h30 às 08h30 da manhã. Logo após é membro da bancada mais ativista da felicidade, das 8h30 até às 10h da manhã, na Jovem Pan Goiânia 106,7FM.

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